sexta-feira, janeiro 30, 2009

Continuam a matar

Mais uma vez o clamor no deserto. Homens da Huíla invadem o parque nacional do Yona no Namibe, disparam sobre animais com armas de guerra, apanham-nos e seguem de volta ao Lubango.
Os homens, aparentemente, bem colocados vão com frequência ao Namibe, com particular gosto para o fim-de-semana.

Nenhuma estrutura do ministério do ambiente se pronunciou. A caça furtiva continua, tal como continua também o risco de extinção. Será apenas gosto pelo gatilho ou o descaso de que deve/devia mandar.

quinta-feira, janeiro 22, 2009

Jornalista ameaçado de morte em Luanda

Aconteceu com o jornalista do magazine comunitário “Inforsambila”, ao tentar obter informações sobre o jovem assassinado ontem por um polícia no seu bairro.

José Zangui contou à Ecclesia que quando chegou ao local, o grupo policial destacado no sítio disse-lhe que o conhecia, mas, pouco depois, o proibiu de recolher os dados pretendidos para a sua reportagem.

«Disseram que se insistisse eu teria o mesmo destino que o jovem que foi baleado. Ainda assim, insisti e eles me apontaram a arma. Pronto, desisti e fiquei apenas como assistente», acrescentou.
Zangui disse, ainda, não ser a primeira vez que lhe sucede este tipo de ameaça. Sofreu outra em Outubro do ano passado, no bairro São Pedro da Barra, onde se registou igualmente a morte de um cidadão.
O autor da ameaça, aquela vez, foi um agente da polícia com o braçal 222, afecto à 11ª esquadra, indicou o jornalista, deplorando a multiplicação dos homicídios envolvendo os agentes da ordem.
Na sua conta, só de Junho a esta parte, no município de Sambizanga, este tipo de homicídios eleva-se a 13 caso

quarta-feira, janeiro 21, 2009

O (meu) reencontro com a Huíla (*)

A Huíla é uma província que me encanta por ser aquela que, para mim, conseguiu fazer da melhor maneira o equilíbrio entre a natureza e o urbano, entre a cidade e o rural e entre o forasteiro e o local.
É uma cidade única, aprazível, com imensas propostas turísticas e gente acolhedora.
Outro aspecto que sempre retive, especialmente do Lubango, é a sua rede de serviços, capaz de agradar os turistas mais exigentes, contrariamente ao que acontece em outros pontos do país que sofrem as consequências de uma eterna assimetria entre o litoral e o interior.

A paisagem que rodeia a cidade alegra quem a visita, com as suas montanhas imponentes e um verde constante, que transmitem uma sensação de paz interior muito buscada nestes dias em que o stress resultante dos engarrafamentos e de horas de trabalho intenso tomam conta de nós. É esta a imagem que tenho da Huíla, uma cidade que aprendi a admirar há seis anos, por altura da primeira visita por aquelas paragens.
Nesta semana, depois de alguns anos distante, pude voltar a visitar o Lubango, que continua acolhedor. Encontrei a mesma beleza, as mesmas gentes e o mesmo encanto. Contudo, há grandes mudanças por lá. Há mais movimento na cidade e até engarrafamento nas horas de ponta, há cada vez mais carros na rua que atravessam estradas em bom estado, contrastando com a realidade de Luanda.
O movimento comercial continua intenso. Abundam as lojas que comercializam produtos diversos, os restaurantes e complexos hoteleiros de luxo, à altura das exigências de uma sociedade cada vez mais consumista, uma realidade que a presença de várias agências bancárias vem comprovar.
Em muitos aspectos o Lubango começa a assemelhar-se com Luanda. Infelizmente, vi alguns episódios tristes que habitualmente vejo por aqui se repetirem por lá, como a agressão de zungueiras. Nas imediações do Governo Provincial local presenciei homens, que desceram de uma carrinha, pontapearem as vendedoras ambulantes, derrubando as bacias, com frutas, que transportavam à cabeça. Eis uma coisa que eu não esperava ver nesta visita.
Outro aspecto que retive pela negativa é o comportamento dos candongueiros que, agora também abundam no Lubango. Numa das vezes em que usei este meio de transporte fui “torturada” por música muito alta, ao ponto de agredir os tímpanos do passageiro. A única diferença é que por lá foi “pop” e por aqui normalmente é “kuduro”. Tanto lá como aqui não adianta pedir para o motorista baixar a música porque, como diriam os brasileiros, ele “não está nem aí”.
A imagem de meninos de rua revolvendo os contentores de lixo em busca de algo marcou a minha memória neste regresso ao Lubango. Com os olhos esbugalhados, olhar penetrante e roupas surradas ou rasgadas, os meninos deixam a nu uma sociedade dominada pelas desigualdades sociais.
No meu regresso notei também que as pessoas têm menos paciência do que antes, estão mais stressadas, preocupadas com os dilemas impostos diariamente pela vida, mas os huilanos continuam amáveis, muito acolhedores e mestres na arte de receber as visitas, deixando-nos com aquela vontade de voltar em breve.
A Huíla é certamente uma província de muitas oportunidades, cujo potencial turístico deveria ser mais divulgado além fronteiras, uma vez que uma exploração sustentada deste potencial poderia beneficiar directamente a população local.

Ao revisitar a Huíla pude reflectir mais sobre o facto de todos nós estarmos afunilados numa Luanda que não tem capacidade de resposta para os seus mais de cinco milhões de habitantes, tudo isso enquanto as províncias do interior continuam subpovoadas. Para inverter este quadro seriam necessárias políticas que incentivassem os quadros nacionais a sediarem-se no interior, o que, certamente, traria ganhos extraordinários para o país.
* Texto de Suzana Mendes, editora-chefe do Jornal Angolense. Publicado na edição de 17 de Janeiro de 2009.

segunda-feira, janeiro 19, 2009

IMPRENSA REGIONAL E LOCAL EM ANGOLA (I)

O AGORA, semanário de grande informação, completou, com alguma pompa e muita circunstância, neste fim-de-semana, o seu décimo segundo aniversario.
Fruto da “ teimosia” de alguns escribas cá da praça, que optaram por romper as barreiras do formalismo dos tempos que se seguiram a tímida abertura democrática no última década, 11 jornalistas decidiram dar corpo á um dos mais projectos jornalísticos privados de Angola.

Com o propósito de falar sobre a data e o rumo do nosso jornalismo convidei o Aguiar dos Santos para o espaço de grande entrevista no programa “ Discurso Directo” da Ecclesia. Foi directo como sempre, tendo falado do passado e do presente, mas também do futuro. Aguiar dos Santos disse “ enquanto for director do Agora, o jornal não vai desaparecer”, numa clara alusão ao surgimento de projectos jornalísticos aparentemente mais “ folgados” financeiramente e mais aptos a captarem para si a já rara fauna jornalística com “J” maiúsculo.
Mas a reflexão sobre a imprensa regional e local é a que mais chama a atenção. Ana Faria, jurista, foi convidada a falar sobre o assunto.
Em zonas remotas de Angola não há um jornal local, uma rádio regional (fora da alçada do poder) ou um mecanismo para a distribuição de jornais ou revistas que se imprimem em Luanda. Está tudo concentrado em Luanda.
Se no passado a Huíla e Benguela tinham experiências neste capítulo, as coisas parecem hoje mal paradas. O jornal “ Kessongo” de Benguela tem dificuldades de sobrevivência. O “Chela Press” tem hoje uma tiragem aquém das expectativas.
O Cruzeiro do Sul, que tinha redacções espalhadas pela Huíla, Huambo, Cunene e Menongue, encontra dificuldades para se manter fora da capital. O jornal huilano “ Omukanda” desapareceu de circulação no Lubango, quando os seus redactores emigraram para Luanda ou perderam a vida. O Lubango ficou sem uma publicação local e que fale das gentes locais.
Hoje apenas se vive de pequenos boletins, geralmente, ligados a igreja católica ou a organizações não governamentais.
Quanto as rádios á situação são pior. Faltam rádios comunitárias, estações privadas no verdadeiro sentido da palavra ou uma rádio que por exemplo localizada no Lubango emita também para o Namibe, o Cunene ou o quanto Kuando Kubango, aquilo a que chamamos de “ estação de rádio regional”, com o auxílio de repetidores em FM. Uma rádio dessas teria uma grande influência na vida das comunidades locais, mesmo com as receitas publicitárias estarem a grande forma agora no sul do país.
Outro ponto, é a necessidade de se criarem Centros de Imprensa a exemplo de Luanda (tarefa das direcções províncias de comunicação social) ou a constituição de Clubes de Imprensa (tarefa dos jornalistas). Benguela é uma das poucas províncias que estabeleceu o seu Clube de Imprensa.
Cada uma das estruturas teria a possibilidade de facilitar a articulação entre os jornalistas locais e aqueles que enviados ou de férias cheguem ao interior.

Gerar morte e não energia electrica

O balanço dos bombeiros sobre os acidentes com geradores é arrasador: Mais de 300 pessoas morreram em 2008 e mais de 700 pessoas ficaram feridas.

O corpo nacional de bombeiros garante que o mau uso, a falta de instrução e a deficiência destes aparelhos estão a empurrar para a morte varias pessoas.
Luanda ainda não se refez da morte de uma família interna, algures no Cassenda, por suposta ingestão de gases perigosos produzidos pelo pequeno gerador eléctrico.
Estes são apenas dois aspectos que concorrem para as alternativas que os angolanos procuram para contornar a crónica falta de energia no país.

Se há é fraca, muitas vezes. Se não há o gerador é a alternativa. Não é por acaso que os habitantes de Luanda já se familiarizaram com o som ensurdecedor dos geradores de todos os tipos, tamanhos, feitios e capacidades. A falta de energia tem sido uma das grandes reclamações dos moradores de Luanda.
O ministério da energia e águas, publicou a anos atrás um plano de desenvolvimento do sector energético do país.
A distribuição do produto a todos os cantos do país, a necessidade de facilitar a sua transportação e a distribuição, principalmente nos grandes centros urbanos são os pontos centrais do plano do sector energético de Angola.
Enquanto se procuram projectos, os geradores matam pessoas.

Vandalismo nas grutas históricas do Namibe

As pinturas rupestres do Tchi Tun Duhulo, na província angolana do Namibe, sul do país, com mais de 2000 anos e candidatas a Património Mundial da UNESCO, estão em rápida degradação devido aos ventos, chuva e actos de vandalismo.

As mais de duas centenas de desenhos de Tchi Tun Duhulo retratam o dia-a-dia dos "artistas" de há mais de 2000 anos, que gravavam nas rochas figuras geométricas representando o sol, animais e instrumentos de trabalho, para descrever o seu quotidiano.

sábado, janeiro 17, 2009

Cá estou!

Um blog, de paixão não pode encerrar. Com um toque de imaginação, refinado com alguma perícia e o sol de todos os dias do planalto sulista.
Esta é uma forma de comunicação. É chegar, criticar, elogiar, chegar onde as capacidades (ainda) permitem.
Maka, como se diz aqui na "Banda"! “Serra da Chela”, vamos continuar mesmo com os trogloditas feito cipaios. Com os verdadeiros jornalistas a escassearem, dando espaço aos " escritores de páginas brancas".

Foto: J.Komba, Pedro Cardoso, Vanda de Carvalho e Manuel Vieira, na Gala do prémio Maboque de Jornalismo ( 2008)

quinta-feira, janeiro 15, 2009

O grito de socorro do Hospital de Caluquembe

Mais um grito de socorro vem de Caluquembe, Huíla. “ Pelo menos 500 mil dólares americanos são necessários para reabilitar o Hospital Municipal de Caluquembe”.
Quem o diz é o Reverendo Diniz Eurico, presidente da IESA (Igreja evangélica sinodal de Angola).

O montante serviria para restaurar por completo as estruturas físicas do hospital, que nunca beneficiou de qualquer obra desde que foi construído, na década de 1950.
O hospital conta com uma maternidade, sala de pediatria, fisioterapia, consultas externas, um salão de internamento com 16 salas e com capacidade de albergar três doentes em cada uma. Possui ainda uma escola técnica de formação de saúde.
O pastor informou que o hospital, único no município, funciona com dois médicos de nacionalidade canadiana, é apoiado por 30 enfermeiros angolanos e assegurado por contribuições de fiéis e dos pacientes.
O município de Caluquembe dista a 193 quilómetros a norte da cidade do Lubango e tem uma população estimada em 231 mil e 39 habitantes.
Resta que as autoridades oiçam a voz do pastor e sigam no seu apoio incondicional a esta nobre iniciativa sanitária.

ESCRITORA HUILANA NO TOPO DA CULTURA ANGOLANA

Maria João, esta zelosa professora, emprestada as letras como escritora de livros infantis encheu recentemente os huilanos de orgulho.

Com outras grandes figuras das artes no país, Maria João Chipalavela foi homenageada pelo Ministério da Cultura do Governo Angolano devido ao seu trabalho em prol das letras no sul do país.
A professora de psicologia veio a Luanda receber um galardão, um diploma de mérito e cinco mil dólares ( 5. 000 USD). Maria João é uma das poucas escritoras de contos infantis na região sul do país.
È formada em psicologia e professora de profissão. Foi directora do Instituto Médio de Educação do Lubango ( no meu tempo, ai no Paula Fracineth, no bairro Hélder Neto) e recentemente foi um dos rostos da comissão executiva provincial de eleições.

segunda-feira, janeiro 12, 2009

Regresso ao Lubango*

“É bom voltar ao Lubango”. A profecia daquele que nos tempos do arco-da-velha, esperava ver todos nós a fazer um recuo e voltar às origens, é quanto a mim cumprida sempre que cruzo aquelas bandas.

O Lubango tem um clima atractivo, semelhante a poucas zonas no planeta. Bem, mas este assunto não é para aqui chamado porque do Lubango, agora felizmente se escreve, embora se limite a iniciativas tímidas, mas louváveis.
Poderei ser acusado de sentimentalista barato, mas por esta cidade nutro um amor verdadeiro, que devia ter pelo meu Lobito.
No Lubango vivi os momentos mais lindos da minha trajectória de vida, bafejado pela piedade incomensurável do Senhor da Vida, passei os meus primeiros 22 anos, quando sai do Lobito com poucos meses de existência.
Em conversa com amigos feitos por entre as montanhas que descrevem a forma circular da cidade, foi-me dito “é bom ver-te”. É “bom voltar ao Lubango” era invariavelmente a minha resposta.
Foi uma das viagens mais completas que fiz, apesar de tê-la feito em muito pouco tempo, pois queria mais. Como é bom viajar com o coração completo?
A paisagem verdejante e o “semblante” acolhedor da cidade receberam a mim e aos outros passageiros em pleno frenesi natalício.
Ao mesmo tempo, percebi que o Lubango é uma cidade velha. De infra-estruturas velhas, e que carece de um ar novo como sugere o seu clima. É inegável a sua cede de crescimento, de passagem a um outro estádio.
Chocou-me contudo, ter dado de caras com obras que geraram mais controvérsia do que alegria para os lubanguenses. Li nos rostos e conversei com gente que criticava severamente as obras atribuídas a administração municipal, que criou duas novas rotundas.
Um sentimento que fica para conversas de bar ao fim da tarde e a boca pequena. Os veículos de opinião na “cidade académica”, foram amordaçados. As rádios não falam, a televisão não mostra e o jornal não escreve, isto quando se trata de opinião diferente da institucional.
As novas obras construídas, uma na conhecida zona dos Laureanos, avenida 4 de Fevereiro e outra, mais triangular na avenida Dr. António Agostinho Neto, nas cercanias do cinema Arco Ires, não trouxeram nenhuma beleza, nem mais valia para o transito, muito pelo contrário.
Não sou arquitecto, mas as dificuldades criadas por estas duas estruturas estão a vista do mais distraído dos cidadãos. Passei por ai quando tive a obrigação de visitar o complexo turístico de Nossa Senhora do Monte, o indiscutível exlibris da cidade do Cristo Rei. Destino de passagem obrigatória.
Outro dos males da cidade é a ainda caótica distribuição de energia eléctrica. A escuridão insondável dos últimos meses, dá sinais de ter terminado, havendo a registar uma certa melhoria, mas este bem indispensável à vida de qualquer mortal em pleno século XXI é tido como um luxo.
Mingua também a água, outro elemento essencial à vida. Os abrangidos pela velha rede beneficiam, com algumas interrupções de quando em quando, mas de quem se espera soluções, nota-se um claro sinal de alergia em dar um toque urbano às nossas zonas periféricas. Ao tema hei de voltar….
* Moisés Sachipangue Rádio Ecclésia – Luanda

sábado, janeiro 10, 2009

A CULTURA EM ANGOLA DIANTE DOS DESAFIOS DA GLOBALIZAÇÃO

Define-se por cultura como o conjunto de manifestações artísticas, sociais, linguísticas e comportamentais de um povo ou civilização. Em suma os traços locais.

Angola tem várias culturas, unidas numa só nação, como garantiam as palavras de ordem dos tempos da “velha senhora”, entenda-se o partido único.
Assim, fazem parte da cultura de um povo entre outras, as seguintes actividades e manifestações: a música, teatro, rituais religiosos, língua falada e escrita, mitos, hábitos alimentares, dança, arquitectura, invenções, pensamentos, formas de organização social e muito mais.
Nesta semana muito se falou sobre a preservação da cultura nacional, com realce para o dia 8 passado, o considerado dia nacional da cultura.
A ideia passada esta semana, pelas autoridades, académicos, estudiosos do ramo cultural e outros intelectuais é da necessidade do resgate de parte da nossa cultura, em decadência geral devido a factores como a globalização, que nos entra porta a dentro num piscar de olhos.
Os sempre atraentes meios tecnológicos como a Internet e as parabólicas são descritos como os que mais fazem desvirtuar os conceitos como angolanidade.
Claro que nos podemos conter perante o avanço da ciência e da técnica. Mas é possível estar protegidos perante a constante perda de valores nacionais a favor de outras culturas distantes da nossa? Como nos proteger? Qual deve ser o plano de acção para que as nossas comunidades estejam firmes? Como “havemos de voltar” (aqui uma alusão ao desejo escrito pelo poeta maior) a nossa real cultura num contexto sócio económico como o que vivemos nos dias de hoje?
O tema da cultura angolana voltou a merecer destaque no discurso de fim de ano do presidente da república, José Eduardo dos santos. O chefe de estado Declarou ser a hora de se começar a construir uma nova mentalidade, sublinhando ser necessário rever certos hábitos e tradições, defender sem reservas o estatuto da família bem estruturada.
Por onde começar a mudar a mentalidade cultural dos angolanos?

Resgatar o verdadeiro sentido da nossa cultura será ruralizar as cidades, ou por conseguinte urbanizar o campo, como volta e meia assistimos?

Rosto da voz Ecclesia, segundo o jornal O País

Entrevista concedida ao Jornal O País, edição nº 9, do dia 9 de Janeiro, com condução de Dani Costa editor de Sociedade. A entrevista está na pagina 36, rubrica " Esperança".
1- Como é que entrou no mundo do jornalismo?

A minha entrada no jornalismo não foi tão acidental. Nutria uma simpatia muito grande por grandes comunicadores que o Lubango sempre teve. São pessoas ás quais rendo uma grande homenagem, Comecei na rádio Huíla, num programa juvenil denominado “ Nova Dimensão” em 1995. Era o contacto da rádio com novos valores. Era gravado de manhã e emitidas as 17 horas de segundo a sexta. O grande desejo de fazer algo de mais útil, pois apenas estudava, impeliu-me a escrever uma carta aos realizadores do programa, queria avançar, ser jornalista de facto. Fui chamado, fiz um pequeno teste, acharam bom. Comecei por assistente do realizador. Quase 13 anos depois, sou o Chefe do Departamento de Informação da Ecclesia.
2- Foi influenciado por alguém para fazer rádio ou sentiu que tinha inclinação para isso?

Sim. Como já disse, grande parte dos grandes comunicadores foram uma influência. Eu costumo dizer que o Lubango é um “ jardim das estrelas”. A lista é infindável de grandes comunicadores que do seu estúdio transmitiam para mim o desejo de um dia estar em frente á um microfone e falar como eles falavam. Falar para as pessoas, contar a vida com notícias. Note que não havia escolas de preparação para jornalistas no Lubango, dai que a tarimba era o melhor mecanismo de aprendizado. Mas a carolice hoje tem sido suplantada pela formação contínua, tanto académica como profissional, com o concurso de nacionais e internacionais. Por exemplo, é para me desenvolver que aderi como membro efectivo ao FAIR – Fórum Africano de Jornalistas de Investigação e não dispenso formação na área de rádio. Espero formar-me em Jornalismo, pois alicercei os meus conhecimentos com a Formação de Formadores em media em Maputo, Moçambique.
3-Ainda se lembra do primeiro dia que entraste num estúdio? Como é que foi ou lembra-se do primeiro trabalho que fez? Foi em Agosto de 1995, uma entrevista sobre o meu bairro. Dirigiam os meus velhos amigos e companheiros, Machel da Rocha e João Carlos. Os joelhos tocavam-se. Tremia que nem vara verde. Hoje me recordo com gargalhadas e senti que poderia ser alguém neste importante mundo da comunicação social. Aquele dia lançou a minha vida para outras caminhadas.
4-O que é que a rádio representa para si? È o mais importante meio de comunicação social em Angola. Fala para as comunidades. Alerta, denuncia, forma e informa. Cá por nós (Ecclesia) lamentamos a falta da extensão do sinal. Eu, na qualidade de profissional de rádio, lamento a falta de estações comunitárias para serem mais próximas das comunidades, rádios que de facto poderiam cumprir um profundo papel junto da camada de base da nossa sociedade. Mas ressalvo que Angola para lá caminha. A minha vivência em Moçambique trouxe a profunda compreensão sobre o papel de uma rádio comunitária há hoje mais de noventa. Os grandes meios, para alem da importância que têm, são de alguma maneira selectivos na abordagem dos assuntos, pelos grupos alvos que têm que atingir. Volta e meia, esquecem as pessoas que vivem na esquina. Daí que gostos de dizer que devemos ser jornalistas da esquina mais próxima aos confins da notícia, 24 horas por dia.
5-A transferência para Luanda foi pacífica ou nem tanto? Como é que se efectuou?

Eu era editor e produtor na Rádio 2000, correspondente da Ecclesia e da Voz da América no Lubango. Vivíamos o ano 2002, um momento particular para a Rádio Ecclesia. Por convite da direcção da altura fui contratado para editor. Rompi com a comercial do Lubango de maneira amigável. Houve reclamação, mas perceberam que andava atrás de um sonho: ser jornalista. Acreditei no meu sonho, a família percebeu e apoiou, a Rádio 2000 compreendeu.
6- És um dos poucos seniores que entraram na sua época que ainda se mantém na emissora Católica de Angola. Qual é o segredo num ambiente de forte sedução, como tem ocorrido regularmente?

Eu olho para o futuro com optimismo. Sou jovem e vejo que se Deus quiser estarei a trabalhar pelas comunidades. Os que saíram são meus amigos. Não confundo opções pessoais com o brilho profissional que eles têm. O ambiente é de forte sedução, como disseste, mas estou convicto de que a vida avança e o futuro pode ser risonho para todos nós, apesar das nossas motivações. Não é segredo para as pessoas que privam comigo que a pressão é frequente.
7- A negação está associada a um bom salário ou outras condições oferecidas pela direcção da Rádio? Ou a ideologia da rádio?

Falo por mim! Gosto de pensar pela minha própria cabeça. Hoje me revejo na Ecclesia, uma rádio que a vários anos conhece o meu trabalho. O público é o grande juiz da minha caminhada, apesar das adversidades. Contudo vamos removendo os espinhos dos caminhos da vida.
8- Como é que avalia o desempenho dos anteriores colegas que passaram para os órgãos públicos fundamentalmente? Alguém o tem marcado em particular?

Continuamos colegas! Marcam-me todos: O Benedito, o João e o meu anterior director executivo Gustavo Silva na TPA, pessoas com as quais privei os bons e os maus momentos do jornalismo. Os dois primeiros foram meus companheiros na Rádio 2000. O Cose e a Regina na TVZImbo também são pessoas com grande capacidade profissional. Eu lembro-me que os dois estiveram a me ver chegar as “suas” rádios. Encontrei a Regina na comercial do Lubango e o Cose na Ecclesia. Receberam-me bem. Olha, a adaptação de todos eles a novas formas de trabalhar, uma nova vida, mostra que têm grande capacidade jornalística.
9-Qual é a mais-valia da Rádio Ecclésia para os trabalhadores e para o público?
A verdade. A frontalidade. A forma de fazer jornalismo olhando apenas para o interesse publico.
10-Como encara a relação da rádio com os vários partidos?

Fomos apodados com vários nomes, de oposição e muito mais. Mas estou seguro em dizer-vos que não há qualquer vínculo com partidos. O vínculo é com a Igreja Católica, o evangelho a base da estação que é pregar e anunciar a palavra do Senhor. Olha, amigo, no antes das eleições acusaram-me de favorecer uma certa ala de um partido. Não tenho ficha de militante seja onde for. E os meus detractores sabem disso.
11- Nunca se sentiu pressionado pelos líderes da Igreja Católica no tratamento de um determinado assunto jornalístico?
Estar a frente de um departamento importante num órgão de comunicação levanta sempre questões dessas. Mas pergunto, o que é uma pressão? È dizer para tratar assim um assunto ou doutra maneira? Há muita subjectividade nestas perguntas e nas respostas. O diálogo marca a nossa casa. As eventuais incompreensões são resolvidas com o diálogo devido a sensibilidade de um jornalismo actuante nos dias de hoje. Ser jornalista é sentir o que pensam todas as sensibilidades nacionais.